Relato 19: Mais um dia na Toca do Cuca

Leopoldo acordou, a barriga roncando. Olhou em volta no espaço subterrâneo mal iluminado. Apenas uma fresta de luz entrava pelo buraco da toca iluminando seus novos companheiros: Jorge e Raimundo.  




Ei jovens, precisamos sair para caçar.  

Está bom vovô, disse um deles. 

Haha sigam meus conselhos que vocês vão viver muito para serem velhos como eu, disse Leopoldo. 

Leopoldo subiu pelo estreito buraco, mais ao chegar perto da saída, sentiu um forte cheiro de urina de cachorro velho. Algo ou alguém havia mijado no buraco da toca. 

-Droga! Quem foi o desgraçado que fez isso! Gritou Leopoldo sacudindo as mãos cheias de mijo. 

Ele fez sinal para seus companheiros terem cuidado e saiu da toca, espada sacada. Os jovens vieram atrás.  

-Deve ter sido o jacaré! Disse Leopoldo. 

- Por que não mijamos na toca também? Jorge sugeriu. 

Não era uma má ideia, marcar a toca, mas se o Cuca se enfurecesse com isso? Leopoldo resolveu deixar para lá, não queria ofender seu velho companheiro, mas por segurança armou uma armadinha no chão, para detectar caso o crocodilo voltasse. Não ia ser bom se eles voltassem e dessem de cara com o crocodilo dentro da toca. Por que ele não entrou?  

Pensando nisso Leopoldo saiu com seus jovens aprendizes para caçar. Comida era o mais importante! A única coisa mais importante que comida era sobreviver. 

A jornada pela mata os levou ao lamaçal e a uma grande arvore negra. Lá no meio uma mochila solitária os tentava. 

-Que lugar é esse? Jorge perguntou. 

-Um lugar perigoso, disse Leopoldo, vê a mochila? As pessoas morrem por cobiça, aprendam isso! 

-O que tem lá? perguntou Jorge. 

-Não lembro bem, nunca estive aqui, mas outros já estiveram, só lembro que é perigoso, com dois novatos é morte certa. 

-Sim, sim, não vamos entrar, já que você disse que é perigoso vamos ouvir, disse Raimundo.  

Leopoldo sorriu satisfeito. Que bom! Talvez eu consiga ensinar esse pessoal a ficar vivo. 

-Vamos atravessar a trilha e caçar do outro lado da floresta, apontou Leopoldo. 

E assim o grupo atravessou a trilha e foram para a mata caçar. Os três estavam sem muita sorte até que em determinado momento Raimundo soltou um grito e espetou com a lança algo bem ao lado de Leopoldo.  

Uma cobra enorme, escondida entre a folhagem, perfeitamente imóvel, sibilou e tentou de um golpe só agarrar e estrangular os três. 

Leopoldo e Jorge pularam para trás, deixando Raimundo ser enrolado pela cobra num abraço mortal. O coração de Leopoldo afundou. Não, de novo não. Mas já era tarde, Leopoldo já sabia o que viria a seguir. O Jovem era muito fraco para resistir. 

Raimundo tentou apoiar a lança no chão para espetar a cobra enquanto essa lhe esmagava, enquanto isso Leopoldo e Jorge golpeavam inutilmente contra o grosso couro de cobra. 

Tudo acabou muito rápido. A bicha abriu a boca e mordeu a cara de Raimundo arrancando pele e massa encefálica. 

Depois foi difícil prestar atenção ao que aconteceu. Leopoldo viu vermelho e decidiu matar a criatura a todo custo, mas seus golpes eram inúteis. Eles estavam numa maré de azar.  

Jorge gritava para que eles fossem embora, mas Leopoldo não ouvia.  

Até que Jorge correu em direção a cobra, com terra em suas mãos e tentou esfregar nos olhos da cobra para cegá-la.  

Foi corajoso, heroico e fatal. Jorge falhou e foi morto numa mordida. Com esse susto o mateiro percebeu que estava sozinho na mata com uma cobra gigante. Esse sou eu? Pensou. Sou tão corajoso para lutar com essa cobra até o fim, sozinho? Eu sou Leopoldo, preciso sobreviver. 

Muito lentamente ele se afastou da bicha. Ela tinha comida. Por que iria persegui-lo? Como esperado a cobra resolveu comer sua comida e esqueceu do sobrevivente que nunca virou as costas para ela enquanto recuava, passo a passo, para mata. 

Cansado, resolveu voltara toca pela trilha, era o caminho mais seguro. Agora sozinho na floresta, sem companheiros para dividir o fardo da caçada, com fome, andando em direção a trilha ele ouviu vozes. 

Será que seriam dois novos companheiros? Ele já conhecia como as regras desse estranho mundo funcionava. Se ele perdesse um número x de companheiros numa aventura, logo novos seriam arrebatados para esse mundo para se juntar a ele. Frequentemente aparecendo na mata, do nada. 

Por precaução, vendo que a trilha estava numa ribanceira mais alta Leopoldo subiu em uma arvore. E se não fossem seus novos aliados? 

A precaução valeu a pena, pois 3 nortistas atravessavam a trilha. Um deles um padre. Leopoldo não viu pessoas. Ele viu comida e equipamentos. O padre carregava uma garrucha! Na mata ele não era a presa, era o predador! 

Sem pensar duas vezes ele pegou seu arco e flecha e disparou no padre, o único que poderia representar alguma ameaça a ele. Sua pontaria era horrível. Como sempre Leopoldo só errava. Mas não tinha problema, ele tinha muitas flechas.  

O padre disparou contra ele, mas ele se escondeu por trás da arvore. A garrucha a distância não ofereceria perigo, desde que ele tomasse cuidado. Ele percebeu que o padre mirava com cuidado então fez uma finta para forçar o padre a gastar um disparo antes dele continuar atirando com a flecha. Funcionou. 

Depois de errar muitas flechas, Leopoldo teve a ideia de invocar o espírito do Cuca, seu velho amigo, que era um arqueiro que nunca errava. Como se guiado por uma mão invisível as flechas começaram a acertar o padre. Os outros dois nortistas alarmados, armados de facão, saíram detrás da arvore que se escondiam e correram em direção a sua arvore. 

Três contra um. Mas Leopoldo não estava preocupado, ele estava no alto e só o padre poderia ser perigoso para ele, e mesmo assim de perto.  

Assim ele ignorou o nortista que tentava subir na arvore com a ajuda da escadinha de seu amigo. O homem tentou, sem sucesso, lhe esfaquear nos pés através de sua armadura de casco de tartaruga. O que uma mera faca podia fazer contra ele? 

Leopoldo continuou a chamar pelo Cuca enquanto alvejava o padre várias vezes com sucesso, até que esse puxou uma bíblia. Uma bola de fogo foi em sua direção. A explosão derrubou Leopoldo da arvore. Levemente ferido. 

Ao cair ele se jogou em cima de um dos nortistas que estava no chão, querendo feri-lo. O nortista matreiro, que puxava uma corda, a soltou e o abraçou para imobilizá-lo no chão.  

O seu companheiro lá no alto da arvore, saltou com a faca para lhe dar num golpe fatal. No último momento Leopoldo se torceu e a faca passou por ele matando na hora o nortista que o segurava. 

Rindo Leopoldo se levantou e sacou sua espada e seu escudo, olhando em volta viu o padre correndo para perto dele, já num movimento de sacar a garrucha. Seu olhar maníaco. Um verdadeiro Berserker. Agora isso era perigoso... 

Leopoldo ignorou o nortista com a faca e deu um passo à frente e num golpe certeiro decapitou o padre com a espada.  

O nortista remanescente fugiu. Não havia por que se arriscar a persegui-lo. Que dia lucrativo! O sobrevivente pegou duas mochilas. Um grande loot! Duas bíblias, uma garrucha, comida, corda, tochas.  

Sim o dia valeu a pena! Não fosse pela perda de seus amigos seria perfeito.  

Ele se sentou e começou a comer a ração quando duas pessoas novas se apresentaram. Como esperado... 

Leopoldo preparou o discurso, aquele que ele sempre usava para novatos: Rapazes bem-vindos, vou cuidar de vocês, sigam meus conselhos e vocês vão viver muito. Tome: aqui tem 2 mochilas,1 faca, 4 tochas. Me sigam, há uma toca aqui perto onde podemos descansar em segurança. 

E era assim que deveria ter acabado a aventura..., mas não acabou...  

Os 3 companheiros desceram a trilha, mas ao se aproximar da toca Leopoldo percebeu que sua armadilha havia sido remexida.  

-Droga que azar! O Cuca deve ter voltado. Será que ele entrou na toca? MEDO. Não queria dar de cara com aquele monstro no escuro. 

Era sempre assim, no final do dia a coisa podia ficar perigosa. Agora o risco era grande para eles.  

Os três reuniram folhas e gravetos se preparando para acender uma fogueira na boca da toca. Leopoldo estava se preparando para jogar fumaça no buraco e espantar o jacaré para fora quando o novo Jorge gritou um aviso. 

Por de trás de Leopoldo, saindo da mata, uma criatura corcunda de 3 metros de altura se erguia. Tinha duas cabeças. Uma cabeça era de Jacaré e outra de Lobo Guará. Os instintos de sobrevivência de Leopoldo se ativaram. A toca era muito pequena para o atual Cuca! 

-Rápido rapazes, para toca! Gritou e sem esperar Leopoldo pulou para segurança do buraco e foi seguido por Felipão, um dos novos rapazes. Jorge ficou na dúvida e não quis se arriscar. O monstro rugiu de raiva e tentou abocanhar Felipão enquanto Jorge deixado de fora, correu para o alto de uma arvore. Por um triz Felipao conseguiu escapar de ser abocanhado. 

-Leoopoldooo! Gritava a criatura! 

Porra esse jacaré agora estava atrás dele? Ele tentou me pegar por trás! O que eu fiz para ele? 

Será que verei meu outro velho amigo montando num pavão morto vivo atrás de mim em breve?  

-Ufa, estamos seguros. Ele é muito grande para entrar aqui. Se eu não estivesse cansado subia para lutar com ele! Disse Leopoldo numa bravata. Ainda assim não era de todo mentira. O Cuca tinha algo que ele desejava... 

Há velhos amigos, em geral eles morrem e ficam mortos. Isso é muito ruim... 

Para piorar o Jacaré furioso não foi embora! Pegou uma grande pedra e enfiou no buraco, pulou em cima várias vezes para enterrá-la com força, prendendo Leopoldo e Felipão dentro da toca.  

Em seguida se deitou do lado da pedra e ficou imóvel a olhar fixamente para o buraco, ignorando Jorge, que do alto da arvore observava a tudo sem poder fazer nada. 

O Bicho ia esperar eles saírem. E agora? 

Fim.

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